No caminho de Deus (Não) há descanso!

Teriam escapado ao Pe. Jean Gailhac, na sua assídua leitura diária da Sagrada Escritura, algumas das citações bíblicas relacionadas com o descanso, para que em seus escritos nos dizer que no caminho de Deus não há descanso?

Comecemos pelo livro do Génesis, Deus abençoou o sétimo dia e nele descansou. No Livro do Levítico o Senhor diz que depois de se colher o que a terra produz devemos celebrar a Festa do Senhor durante sete dias e que o primeiro e oitavo dias serão dias de descanso; no Salmo 117 o salmista exorta-nos a retornar ao descanso porque Deus é bom connosco!; no evangelho de S. Mateus, Jesus lança o convite: vinde a mim todos vós que andais cansados e sobrecarregados e eu vos darei descanso; na carta aos Hebreus, S. Paulo diz-nos que todo aquele que entra no descanso de Deus também descansa das suas obras, como Deus descansou das suas…

No caminho de Deus não há descanso. Parar seria perder tudo!

Como é que o Pe. Gailhac ousa dizer-nos que no caminho de Deus não há descanso?

Sabia tão bem desligar, fazer uma pausa, inclinar a cabeça, fechar os olhos, ouvir uma boa música!!!

No meu entendimento o Pe. Jean Gailhac tem razão. Não se refere à importância do descanso físico, pois esse para Gailhac é importante – só avança quem descansa – e está implícito à nossa condição de seres humanos necessitados de tempos de lazer e paragem, mas, refere-se ao nosso caminho interior para Deus e exterior para com os nossos irmãos. Neste caminho não há descanso, esmorecimento, desânimo, procrastinação, deitar-nos à sombra do caminho já feito, fazer uma folguinha por mais breve que seja…

Na medida em que o seu caminhar espiritual se tornava mais amadurecido, mais o Pe. Jean Gailhac insistia, insistia e voltava a insistir, quase se tornava obsessivo, em dizer-nos que fomos feitos para Deus e o nosso coração não pode descansar enquanto não repousar em Deus! GS/31/VIII/77/B; que é necessário trabalhar sem descanso como o jardineiro cioso do seu canteiro GS/13/IX/80/A*; que não podemos ter descanso enquanto Jesus Cristo não estiver plenamente formado em nós. GS/1/III/81/A*.

Este caminhar implica, assim, centralidade e alinhamento com Jesus Cristo na sua missão geradora de vida, clareza de propósito, dinamismo, discernimento, diálogo, resiliência, atitude interior de peregrinas e peregrinos, buscadores da vontade de Deus e artistas da novidade do seu Espírito.

Como peregrinos, muitas vezes precisamos de voltar atrás para retomar o caminho certo. Recordo as peregrinações a pé – Santiago Compostela e Fátima – pensamos que vamos no caminho certo, constatámos que estamos errados, voltamos atrás e retomamos novamente o caminho. Na nossa vida interior algo de semelhante acontece. Às vezes pensamos que estamos no caminho certo, que somos quase “santos perfeitos” surgem dificuldades, esmorecemos no serviço aos outros, deixamos de rezar, de fortalecer os laços de amizade, de cultivar os relacionamentos e, de repente, percebemos que precisamos de voltar atrás e retomar caminho com Deus e com aqueles que Deus coloca ao nosso lado.

O desafio é não parar! É viver este caminho como um itinerário espiritual, como “santos imperfeitos” que procuram sintonizar o coração com o coração de Deus e onde nos deixamos, constantemente, inquietar na busca da proximidade de Deus.

Viver em jeito de “vai-vém” num caminhar continuo de idas e vindas – para a frente, recuar e voltar a seguir em frente! Não há linha reta para Deus! É caminhar sempre! Agarrar todas as janelas de oportunidade para, interiormente, caminhar! Agarrar todas as oportunidades para fazer o bem, bem feito. Viver a 100% a Fé e Zelo.

Quando me foi proposto escrever sob a inspiração desta frase do nosso fundador, o meu coração sorriu interiormente. Confesso que desde que conheci o nosso Instituto, em 1994, primeiro como colaboradora e depois como irmã, que esta frase tem sido o motor impulsionador e inspirador para viver a minha consagração a Jesus Cristo, no nosso Instituto.

Estamos a viver um tempo especial na Igreja. Está a decorrer a Assembleia Sinodal em Roma. Somos TODOS, desafiados a caminhar. Como Igreja Universal somos desafiados a caminhar sempre, sem parar, escutando o Espírito Santo e responder de forma nova, criativa e sinodal aos apelos sociais, eclesiais e espirituais dos tempos de hoje.

Como diz o nosso Venerável Jean Gailhac nem um momento de descanso ou de repouso. Estes são para o Céu. A vida é um caminhar continuo porque o tempo que nos é dado para nos salvar, anda sempre e só parará quando se absorver na imutável eternidade. GS/6/VI/83/A*.

Afinal, nada da Sagrada Escritura escapou ao Pe. Jean Gailhac…

No caminho de Deus (não) há descanso!

Ir. Conceição Pereira, rscm

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